Entenda como o tratamento da obesidade protege o coração
As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte no Brasil. São mais de mil óbitos por dia, segundo dados da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC).
Bolacha recheada, macarrão instantâneo, refrigerante e salgadinho: você sabe o que esses alimentos têm em comum? Todos são ultraprocessados, ou seja, produtos industrializados que contêm substâncias químicas em sua formulação, como corantes, conservantes, aromatizantes e outros ingredientes¹.
Publicado em: 24 de fevereiro
O consumo desse tipo de alimento no Brasil tem aumentado nos últimos anos. Segundo pesquisa da Universidade de São Paulo (USP), entre 2008 e 2017, houve um crescimento de 5,5%².
O percentual não parece tão expressivo, mas os ultraprocessados já representam cerca de 20% das calorias consumidas pela população brasileira, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)3. Para ilustrar, considerando um consumo médio de 2.000 calorias diárias, é como se uma pessoa comesse um cheeseburguer e tomasse um copo de refrigerante (cerca de 400 calorias) todos os dias.
Por que os alimentos ultraprocessados fazem mal à saúde?
Mas por que esses alimentos, que são tão consumidos, fazem mal à saúde? Isso acontece porque eles são nutricionalmente desbalanceados. O seu processo de fabricação envolve diversas técnicas de processamento e um excesso de ingredientes, como sal, açúcar, gorduras e substâncias de uso exclusivamente industrial1.
Muitas dessas substâncias processadas em laboratório (que incluem partes de outros alimentos, como proteínas de soja e do leite, e fontes orgânicas, como petróleo e carvão) atuam como aditivos, ou seja, são ingredientes adicionados sem o propósito de nutrir e cuja função é estender a validade desses alimentos ou adicionar cor, sabor, aroma e textura para torná-los gostosos e atraentes¹.
Os ultraprocessados são pobres em fibras, vitaminas e minerais, além de muito calóricos. Por serem hiperpalatáveis, ou seja, bastante saborosos, e fáceis de serem consumidos, pois já estão prontos ou possuem uma forma prática de preparação, tendem a ser consumidos em excesso e podem levar ao sobrepeso e à obesidade¹.
Outro fator que relaciona o consumo desses alimentos ao excesso de peso é que eles possuem um baixo potencial de saciedade e podem comprometer os mecanismos do nosso corpo que indicam quando estamos com fome e quando já estamos satisfeitos. A sinalização de saciedade após a ingestão dos ultraprocessados não ocorre ou ocorre tardiamente¹.
Como identificar os alimentos ultraprocessados?
Uma forma simples de identificar se um alimento é ultraprocessado é olhar a lista de ingredientes. Um número elevado de itens (geralmente cinco ou mais) e, sobretudo, a presença de ingredientes com nomes pouco familiares indicam que o produto pertence à categoria de alimentos ultraprocessados. Alguns exemplos desses ingredientes são: gordura vegetal hidrogenada, xarope de frutose, espessantes, emulsificantes, corantes, aromatizantes e realçadores de sabor¹.
Uma medida que tem facilitado a identificação desses produtos é o
novo padrão de rotulagem de
alimentos e bebidas industrializados, aprovado pela Agência Nacional
de Vigilância Sanitária (Anvisa), que entrou em vigor em outubro de
2022⁴.
As embalagens devem apresentar um selo frontal com um símbolo de lupa, indicando se o alimento possui altos teores de açúcar, gordura e sódio. O objetivo é facilitar a compreensão do consumidor sobre a composição de ingredientes prejudiciais à saúde e auxiliá-lo a fazer escolhas alimentares mais conscientes⁴.
Alimentos que viciam e causam doenças
Os alimentos ultraprocessados são tão viciantes quanto o cigarro. Essa foi a conclusão de um estudo realizado em 2022 por pesquisadores da Universidade de Michigan e da Virginia Tech, nos Estados Unidos⁵.
Segundo a pesquisa, esses alimentos atendem a todos os critérios de uma substância viciante como o tabaco: estimulam o consumo compulsivo; aumentam a dopamina (neurotransmissor ligado à sensação de prazer e motivação), melhorando o humor e diminuindo sentimentos negativos; são altamente reforçadores, ou seja, a repetição de seu consumo é um comportamento estimulado; e desencadeiam no organismo desejos intensos para serem consumidos⁵.
Há vários estudos que associam o consumo de alimentos ultraprocessados a diversas condições crônicas. Segundo uma pesquisa publicada em 2020, pessoas que consomem ultraprocessados com frequência possuem um risco 26% maior de desenvolver obesidade⁶.
Outra pesquisa, também de 2020, concluiu que o consumo excessivo desses alimentos está associado ao sobrepeso e obesidade (39%), circunferência maior da cintura (39%), níveis baixos de colesterol “bom”, o HDL (102%), e síndrome metabólica (79%)⁷.
Os ultraprocessados também estão relacionados a uma maior possibilidade de desenvolver câncer, de acordo com um estudo publicado em 2023. Cada aumento de 10% no consumo desses alimentos representou uma elevação de 2% na incidência geral de câncer e um aumento de 19% no risco de câncer de ovário, especificamente⁸.
Pesquisadores da USP, em parceria com outras instituições, realizaram um levantamento com base em dados de 2019 e estimaram que o Brasil tem 57 mil mortes prematuras (pessoas de 30 a 69 anos) por ano associadas ao consumo de ultraprocessados9. É mais que o total do número de homicídios no país no mesmo período (45,5 mil, segundo o Atlas da Violência)¹⁰.
O segredo é o equilíbrio
Os números alarmantes das pesquisas reforçam o quanto é importante melhorarmos a nossa alimentação. Não é que o consumo de alimentos ultraprocessados seja proibido: ele só não deve ser a regra.
De acordo com o Guia Alimentar para a População Brasileira, do Ministério da Saúde, os alimentos in natura ou minimamente processados são a base de uma alimentação nutricionalmente balanceada¹ Veja alguns exemplos no quadro abaixo.
A regra de ouro é: não troque a comida “feita na hora” (arroz, feijão, sopas, saladas, refogados de legumes e verduras, macarronada etc.) por produtos que dispensam preparação culinária (sopa de pacote, macarrão instantâneo, molhos industrializados, misturas para bolos, entre outros)¹.
Para ajudar no processo de reeducação alimentar, é importante contar com uma equipe multidisciplinar, que tenha, além de médico, psicólogo e educador físico, um nutricionista. Esse profissional irá auxiliar na elaboração de um plano alimentar individualizado, levando em consideração preferências alimentares, aspectos financeiros e estilo de vida, com foco em melhorar a saúde e garantir qualidade de vida¹¹.
Quais os tipos de alimentos?
Alimentos in natura ou minimamente processados
Alimentos in natura são aqueles obtidos diretamente de plantas ou de
animais e adquiridos para consumo sem que tenham sofrido qualquer
alteração.
Alimentos minimamente processados são alimentos in
natura que, antes de sua aquisição, foram submetidos a alterações
mínimas. Exemplos:
legumes, verduras, frutas, batata, mandioca,
arroz, milho, feijão, grão de bico, frutas secas, castanhas, amendoim,
farinhas, carnes resfriadas ou congeladas, ovos, leite, chá, café e água.
Ingredientes culinários processados
são produtos extraídos de alimentos in natura ou diretamente da natureza e usados para temperar e cozinhar, como óleos, gorduras, açúcar e sal.
Seu consumo deve ser moderado.
Alimentos processados
Produtos fabricados pela indústria com a adição de sal ou açúcar a alimentos in natura ou minimamente processados para torná-los duráveis e agradáveis ao paladar. Exemplos: legumes em conserva, frutas em calda, enlatados, queijos e pães.
Seu consumo deve ser limitado.
Alimentos utraprocessados
Produtos cuja fabricação envolve diversas etapas e técnicas de
processamento e vários ingredientes, muitos deles de uso
exclusivamente industrial. Exemplos:
refrigerantes, biscoitos
recheados, sorvetes, salgadinhos de pacote, macarrão instantâneo,
balas, mistura para bolo, iogurtes adoçados e aromatizados, produtos
congelados e prontos para o consumo (pizza, hambúrguer, nuggets etc.),
salsicha e outros embutidos, pão de forma, molhos prontos, cereais
açucarados, entre outros.
Seu consumo deve ser evitado.
Saiba mais:
Entenda as causas da obesidade
Sobrepeso também faz mal a saúde
Referências:
1. Ministério da Saúde. Guia alimentar para
a população brasileira. Disponível em https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf.
Acesso em julho de 2023. 2. Louzada MLC, Cruz GL et al. Consumo
de alimentos ultraprocessados no Brasil: distribuição e evolução
temporal 2008–2018. Rev Saúde Pública. 2023 Mar
15;57:12. 3. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE). Pesquisa de orçamentos familiares 2017-2018. Análise do
consumo alimentar pessoal no Brasil. Disponível em
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101742.pdf .
Acesso em julho de 2023. 4. Instrução Normativa-In nº 75, de 8
de outubro de 2020. Estabelece os requisitos técnicos para declaração
da rotulagem nutricional nos alimentos embalados. Diário Oficial da
União. 9 out 2020. Disponível em https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/instrucao-normativa-in-n-75-de-8-de-outubro-de-2020-282071143.
Acesso em julho de 2023. 5. Gearhardt AN, DiFeliceantonio AG.
Highly processed foods can be considered addictive substances based on
established scientific criteria. Addiction. 2023
Apr;118(4):589-598. 6. Askari M, Heshmati J et al.
Ultra-processed food and the risk of overweight and obesity: a
systematic review and meta-analysis of observational studies. Int J
Obes (Lond). 2020 Oct;44(10):2080-2091. 7. Pagliai G, Dinu M et
al. Consumption of ultra-processed foods and health status: a
systematic review and meta-analysis. Br J Nutr. 2021 Feb
14;125(3):308-318. 8. Chang Kiara, Gunter MJ et al.
Ultra-processed food consumption, cancer risk and cancer mortality: a
large-scale prospective analysis within the UK Biobank.
eClinicalMedicine 2023 Jan 31;56:101840. 9. Nilson EAF, Ferrari
G et al. Premature Deaths Attributable to the Consumption of
Ultraprocessed Foods in Brazil. Am J Prev Med
2023;64(1):129-136. 10. Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea). Atlas da violência. Disponível em https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/dados-series/328.
Acesso em julho de 2023. 11. Mendes AA, Ieker ASD et al.
Multidisciplinary programs for obesity treatment in Brazil: A
systematic review. Rev. Nutr. 2016 Nov-Dec; 29(6):867-884.
BR23OB00101 – Setembro/2023